29 de novembro de 2008

A cidade são os homens

Porventura considerais que uma cidade é feita de pedras e de paredes? A cidade são os homens e não as casas!

Santo Agostinho

Correção

Tudo o que nesta vida possa um homem sofrer, se ele o aproveita para se corrigir, é para o seu bem; senão é duplamente condenado: aqui, sofre as penas temporais; no além, pagará as eternas.

Santo Agostinho

Atitude no sofrimento

Ó homem, não está em tua mão sofrer ou não sofrer, mas sim se no sofrimento tua vontade se degrada ou se dignifica.

Santo Agostinho

Misericordioso flagelo do castigo

E os homens se admiram - e oxalá ficassem só na admiração, ao invés de também blasfemarem - quando Deus corrige o gênero humano e envia o misericordioso flagelo do castigo, para que os homens se emendem antes do dia do juízo. E o faz, em geral, sem escolher os que prova, pois não quer que ninguém se perca. Atinge, pois, indistintamente, pecadores e justos; ainda que ninguém possa considerar-se justo, pois até Daniel confessa seus próprios pecados.

Santo Agostinho

De urbis excidio

De urbis excidio. Nossas cidades foram arrasadas.

Na catástrofe que se abateu sobre o Vale do Itajaí, tivemos uma oportunidade para observar a natureza humana como que sob uma lente de aumento. As escolhas morais em um momento como este ficam mais aparentes.

As pessoas, quando escolhem, se posicionam e se dividem em dois campos. Trigo ou joio. Ovelhas ou carneiros. Do lado direito e do lado esquerdo.

Houve quem esquecesse de suas próprias necessidades para ajudar os outros em abrigos e quem aplicasse golpes na praça a pretexto de recolher ajuda.

Uns acolheram estranhos em suas casas; outros entraram nas casas abandonadas para furtar.

Houve quem distribuísse pão a preço de custo ou mesmo de graça e quem praticasse preços abusivos aproveitando-se de pessoas que não tinham opção.

Pessoas organizaram páginas com informações vitais na Internet. Outras criaram comunidades para fazer piadas macabras sobre a tragédia.

Voluntários se juntaram às forças de trabalho. Outros passavam trotes usando as linhas de emergência.

Inúmeros anônimos ajudaram discretamente sem que uma mão soubesse o que a outra estava fazendo, enquanto alguns famosos aproveitavam os holofotes para se promover ainda mais.

Como ensinou Santo Agostinho, convivem na Terra duas cidades: a cidade de Deus e a cidade dos homens. E nesta tragédia vimos as duas claramente.

5 de novembro de 2008

Seremos obrigados a expiar por nossos pecados

Espero que nenhum de vocês tenha a menor dúvida a respeito da existência do Purgatório. A Igreja, à qual Jesus Cristo prometeu a guia do Espírito Santo e à qual, consequentemente, não pode se enganar nem nos enganar, ensina-nos sobre o Purgatório de um modo bem claro e positivo. Isto é uma certeza mais que certa, de que lá é um lugar onde as almas dos justos completam a expiação por seus pecados, antes de serem finalmente adimitidas na glória do Paraíso, o qual, diga-se de passagem, já está assegurado a elas.

Sim meus caros irmãos, isto é um artigo de Fé: se nós não tivermos feito penitência proporcional à gravidade de nossos pecados, ainda que tenhamos sido absolvidos no Sagrado Tribunal da Confissão, nós seremos obrigados a expiar por eles.

S. João Batista Vianney

19 de setembro de 2008

Apóstola dos apóstolos

Os Evangelhos informam-nos que as mulheres, diversamente dos Doze, não abandonaram Jesus na hora da Paixão. Entre elas destaca-se, em particular, Madalena, que presenciou a Paixão, mas que para além disso foi também a primeira testemunha do Ressuscitado e quem O anunciou. É precisamente para Maria de Magdala que S. Tomás de Aquino reserva a singular qualificação de «apóstola dos apóstolos», dedicando-lhe este bonito comentário: «Como uma mulher tinha anunciado ao primeiro homem palavras de morte, assim uma mulher foi a primeira a anunciar aos apóstolos palavras de vida».

Papa Bento XVI

13 de setembro de 2008

As mãos de Maria

É vontade de Deus que nada tenhamos senão pelas mãos de Maria.

São Bernardo

10 de setembro de 2008

A verdadeira dignidade

A verdadeira dignidade do homem e a sua excelência reside nos seus costumes, isto é, na sua virtude; a virtude é o patrimônio comum dos mortais, ao alcance de todos, dos pequenos e dos grandes, dos pobres e dos ricos; só a virtude e os méritos, seja qual for a pessoa em quem se encontrem, obterão a recompensa da eterna felicidade.

Papa Leão XIII
Rerum Novarum

8 de setembro de 2008

O primeiro ser plenamente humano

"Deus abandonará o seu povo até ao tempo em que der à luz aquela que há-de dar à luz..."
Livro de Miqueias 5

Quando chegou para a natureza humana o momento de se encontrar com a natureza divina e de ficar unida a ela tão intimamente que as duas não formassem senão uma só pessoa, cada uma delas devia necessariamente ter-se manifestado já na sua integridade. No que toca a Deus, Ele tinha-se revelado da maneira que convinha a Deus; a Virgem é aquela que dá à luz a natureza humana... Até parece que, se Deus se misturou com a natureza humana não na sua origem mas no fim dos tempos (Ga 4,4), foi porque, antes desse momento, esta natureza ainda não tinha plenamente nascido, ao passo que agora, em Maria, ela aparece pela primeira vez na sua integridade...
     
É tudo isto que viemos celebrar hoje, com todo o seu brilho. O dia do nascimento da Virgem é também o do nascimento da humanidade inteira, porque esse dia viu nascer o primeiro ser plenamente humano. Agora, "a terra" verdadeiramente "deu o seu fruto" (Sl 66,7), esta terra que, desde sempre, entre silvas e espinhos, apenas tinha produzido a corrupção do pecado (Gn 3,18). Agora o céu sabe que não foi criado em vão, uma vez que a humanidade, para a qual foi construido, vê a luz do dia...
      
É por isso que toda a criação faz subir até à Virgem um louvor sem fim, que todas as línguas cantam a sua glória em uníssono, que todos os homens e todos os coros dos anjos não cessam de compor hinos à Mãe de Deus. Também nós a cantamos e lhe oferecemos todos juntos o nosso louvor... Só a ti, Virgem digna de todo o louvor, assim com ao teu amor pelos homens, cabe apreciar o benefício da graça obtida não por nós mas pela tua generosidade. Escolhida como dom oferecido a Deus entre toda a nossa raça, revestiste de beleza o resto da humanidade. Santifica, pois, o nosso coração que concebeu as palavras que te dirigimos e impede o terreno da nossa alma de produzir qualquer mal, pela graça e bondade de teu Filho único, Senhor nosso Deus e nosso Salvador, Jesus Cristo.

São Nicolau Cabasilas (c. 1320-1363),
teólogo leigo grego

5 de setembro de 2008

O que Lhe entrega?

"Se você não entrega o seu coração a Deus, o que Lhe entrega?"


Padre Pio de Pietrelcina

Corresponder ao Criador

De entre todos os movimentos da alma, de entre todos os sentimentos e os afetos da alma, o amor é o único que permite à criatura corresponder ao seu Criador, senão de igual para igual, pelo menos de semelhante para semelhante.


São Bernardo (1091-1153),
monge cisterciense e doutor da Igreja

4 de setembro de 2008

Pescadores de homens

"Eis que vou enviar grande número de pescadores que os pescarão, oráculo do Senhor" (Jr 16,16). Mostra-nos assim a nossa grande missão: a pesca. Diz-se ou escreve-se por vezes que o mundo é como um mar. Há muita verdade nesta comparação. Na vida humana, como no mar, há períodos de calma e de tempestade, tranquilidade e ventos violentos. Os homens encontram-se frequentemente em águas amargas, entre grandes vagas; avançam no meio de tormentas quais tristes navegadores, até quando parecem alegres, mesmo exuberantes: as suas gargalhadas tentam dissimular o seu desencorajamento, a sua decepção, a sua vida sem caridade nem compreensão. Devoram-se uns aos outros, como os peixes.

Fazer de modo a que todos os homens entrem, de boa vontade, nas redes divinas e se amem uns aos outros, eis a tarefa dos filhos de Deus. Se somos cristãos, devemos transformar-nos nestes pescadores que descreve o profeta Jeremias com a ajuda de uma metáfora que Jesus Cristo igualmente empregou por várias vezes: "Vinde após mim e farei de vós pescadores de homens", disse ele a Pedro e a André.

S. José Maria Escrivá de Balaguer (1902-1975),
presbítero, fundador

3 de setembro de 2008

Ele fala-nos ao coração quando é o coração que lhe reza

Como não recordar um Mestre como este, que nos ensinou a oração, que a ensinou com tanto amor e com um tão vivo desejo de que ela nos seja proveitosa?... Sabeis que Ele nos ensina a rezarmos no isolamento. É assim que Nosso Senhor fazia sempre, quando rezava, não que isso lhe fosse necessário, mas porque queria dar-nos o exemplo. Já dissemos que não seríamos capazes de falar ao mesmo tempo a Deus e ao mundo. Ora não fazem outra coisa os que recitam as suas orações e, ao mesmo tempo, escutam o que se diz à volta deles, ou se demoram nos pensamentos que lhes ocorrem sem se preocuparem em afastá-los.

Não falo daquelas indisposições que aparecem por vezes e, ainda menos, da melancolia ou da fraqueza de espírito que afligem certas pessoas e as impedem de se recolher, apesar dos seus esforços. O mesmo acontece com aquelas tempestades interiores que às vezes podem perturbar os fiéis servos de Deus, mas que Este permite para seu maior bem. Na sua aflição, procuram em vão a calma. Façam o que fizerem, não conseguem estar atentos às orações que pronunciam. O seu espírito, longe de se fixar em nada, parte de tal maneira à aventura que eles parecem ter sido atingidos por uma espécie de frenesim. Pelo sofrimento que isso lhes provoca, verão bem que a culpa não é deles; não se atormentem, pois, por isso... Uma vez que a sua alma está doente, que se apliquem a conceder-lhe algum repouso e se ocupem em qualquer outra obra de virtude. É isso que devem fazer as pessoas que se vigiam a si mesmas e que compreendem que não se poderia falar a Deus e ao mundo ao mesmo tempo.

O que depende de nós é que tentemos estar no isolamento para rezar. Queira Deus que isso baste, repito, para compreendermos em presença de quem estamos e que resposta dá o Senhor aos nossos pedidos! Pensais que Ele se cala, de tal forma que não o ouçamos? Certamente que não. Ele fala-nos ao coração quando é o coração que lhe reza.

Santa Teresa de Ávila (1515-1582),
carmelita, doutora da Igreja

31 de agosto de 2008

Praticam e aplaudem

A ira de Deus se manifesta do alto do céu contra toda a impiedade e perversidade dos homens, que pela injustiça aprisionam a verdade.

São repletos de toda espécie de malícia, perversidade, cobiça, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade.

São difamadores, caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, soberbos, altivos, inventores de maldades, rebeldes contra os pais.

São insensatos, desleais, sem coração, sem misericórdia.

Apesar de conhecerem o justo decreto de Deus que considera dignos de morte aqueles que fazem tais coisas, não somente as praticam, como também aplaudem os que as cometem.

São Paulo Apóstolo
Romanos, 1, 18.29-32

30 de agosto de 2008

"Depois que o Supremo bater o martelo, não adiantará recorrer ao Santo Padre." - Ministro Marco Aurélio de Mello em entrevista à Veja, sobre a permissão para o aborto de anencéfalos.

Mas à Nossa Senhora sempre adiantará, sim, recorrer. Quanto mais negra a noite, maior é o anseio pela Aurora. Por aquela que esmaga a cabeça da Serpente.

Sub tuum praesidium confugimus,
Sancta Dei Genitrix.
Nostras deprecationes ne despicias
in necessitatibus nostris,
sed a periculis cunctis
libera nos semper,
Virgo gloriosa et benedicta. Amen.

À vossa proteção recorremos,
Santa Mãe de Deus.
Não desprezeis as nossas súplicas
em nossas necessidades,
mas livrai-nos sempre
de todos os perigos,
ó Virgem gloriosa e bendita!

O tempo não nos pertence

«Meus irmãos, até agora nada fizemos; comecemos, pois, a partir de hoje.» Era a si próprio que São Francisco dirigia esta exortação; humildemente, façamo-la nossa. É verdade que ainda nada fizemos, ou que fizemos muito pouco! Os anos sucedem-se, sem que perguntemos a nós próprios o que podíamos ter feito; quer dizer que não há nada a modificar, a acrescentar ou a cortar na nossa conduta? Vivemos sem preocupações, como se não estivesse para chegar o dia em que o Juiz eterno nos chamará a Si, em que teremos de prestar contas dos nossos actos e daquilo que fizemos com o nosso tempo.

Não percamos tempo. Não deixemos para amanhã aquilo que podemos fazer hoje; os túmulos estão cheios de boas intenções; aliás, quem sabe se amanhã ainda estaremos aqui? Oiçamos a voz da nossa consciência, que é a voz do profeta: «Oxalá ouvísseis a Sua voz! Não torneis duros vossos corações» (Sl 94, 7-8).

Só temos à nossa disposição o momento presente; velemos, pois, e vivamo-lo como um tesouro que nos foi confiado. O tempo não nos pertence; não o desperdicemos.

São [Padre] Pio de Pietrelcina (1887-1968), capuchinho

28 de agosto de 2008

Saibamos conduzir nossa alma

Aquele que exerce um comércio não procura simplesmente realizar um lucro. Esforça-se também, por todos os meios, por aumentá-lo e acrescentá-lo. Empreende novas viagens e renuncia às que lhe parecem não trazer proveito; só parte com a esperança de um negócio. Como ele, saibamos também conduzir a nossa alma pelos caminhos mais diversos e mais oportunos e adquiriremos, oh ganho supremo e verdadeiro, esse Deus que nos ensina a rezar na verdade.

S. Macário (? - 405),
monge no Egipto

27 de agosto de 2008

Fascinado pela luz do Evangelho

São Paulo se dedicou ao anúncio do Evangelho sem economizar energias, enfrentando uma série de duras provas.

Seu compromisso só se explica com uma alma verdadeiramente fascinada pela luz do Evangelho, enamorada de Cristo, uma alma baseada em uma convicção profunda: é necessário levar ao mundo a luz de Cristo, anunciar o Evangelho a todos.

Papa Bento XVI

26 de agosto de 2008

Dar-vos-ei um coração novo

Oh meu Deus, quão admirável é o Vosso amor por nós! Sois infinitamente digno de ser amado, louvado e glorificado! Não tendo nós coração, nem espírito, que seja digno deste amor, a Vossa sabedoria e a Vossa bondade concederam-nos, porém, forma de o ser: destes-nos o Espírito e o coração do Vosso Filho, para que fosse o nosso próprio espírito e o nosso próprio coração, segundo a promessa que fizestes pelo Vosso profeta: «Dar-vos-ei um coração novo e introduzirei em vós um espírito novo» (Ez 36, 26); e, para que soubéssemos que coração e que espírito novos eram estes, acrescentastes: «Dentro de vós porei o Meu espírito» (27). Só o Espírito e o coração de Deus são dignos de amar e de louvar um Deus, são capazes de O bendizer e de O amar como Ele deve ser bendito e amado. Foi por isso que nos destes o Vosso coração, o coração do Vosso Filho, Jesus Cristo, bem como o coração de Sua Mãe e o coração de todos os santos e anjos que, em conjunto, formam um só coração, como a cabeça e os membros formam um só corpo (Ef 4, 15). [...]

Renunciai, pois, irmãos, ao vosso coração e ao vosso espírito, à vossa vontade e ao vosso amor próprio. Dai-vos a Jesus, para entrardes na imensidão do Seu coração, que contém o de Sua Mãe e o de todos os santos, para vos perderdes nesse abismo de amor, de humildade e de paciência. Se amardes o vosso próximo e tiverdes de fazer um acto de caridade, amai-o o fazei o que deveis no coração de Jesus. Se se trata de vos humilhardes, que seja na humildade desse coração. Se se trata de obedecerdes, que seja na obediência do Seu coração. Se tendes de louvar, de adorar, de agradecer a Deus, que seja em união com a adoração, o louvor e a acção de graças que nos são dados por esse grande coração. [...] O que quer que façais, fazei todas as coisas no espírito desse coração, renunciando ao vosso, entregando-vos a Jesus, para agirdes no Espírito que anima o Seu coração.

São João Eudes (1601-1680),
sacerdote, pregador, fundador de institutos religiosos

25 de agosto de 2008

Maria nos precedeu no céu

"Maria subiu ao Céu: alegrai-vos, com Cristo Ela reina para sempre. Aleluia!"

(antífona do Magnificat)

Este anúncio fala-nos de um acontecimento totalmente único e extraordinário, mas que está destinado a encher de esperança e de felicidade o coração de cada ser humano. Com efeito, Maria é a primícia da humanidade nova, a criatura em que o mistério de Cristo, encarnação, morte, ressurreição e ascensão ao Céu já teve o seu pleno efeito, resgatando-a da morte e levando-a de corpo e alma ao reino da vida imortal.

Bento XVI

22 de agosto de 2008

Ela é a Rainha

Por sua pureza imaculada, Ela é a Rainha eleita pelo próprio Deus, a Rainha amada pelos Anjos, que das alturas dos Céus reina sobre todo o universo das almas e dos mundos. Com o título de "Mãe de Deus", é Ela a Rainha dos Doutores. Pela sua força de alma, é Ela a Rainha dos mártires. Por seu amor e Justiça, é Ela a Rainha de todos os santos e de todos os predestinados por Deus à glória eterna.

Preenchida, desde o primeiro momento instante, pelas radiantes e vivificantes luzes do Verbo, absolutamente iluminada na fé ardente que a impulsionava, sua alma, virgem amante e pura, penetra o olhar, infinitamente mais profundo e divino que o dos Querubins e Serafins, no mistério insondável de Cristo do qual ela será a Mãe virgem, sem mácula. Ela é a alma mais apaixonada pelo Pai e a mais amada do Pai depois de Jesus e, por conseguinte, a mais magnificamente enaltecida pelos favores divinos. Todos os Anjos e Santos reunidos, em relação a Ela parecem ausentes, pois a soberana presença preenche o Céu e a Terra.

Marta Robin
"Prends ma vie Seigneur" (Entrego-te a minha vida, Senhor)

19 de agosto de 2008

Os ricos salvar-se-ão?

Não se trata de rejeitar os bens susceptíveis de ajudar o próximo. É da natureza das posses serem possuídas; como é da natureza dos bens difundir o bem; Deus destinou-os ao bem-estar dos homens. Os bens estão nas nossas mãos como ferramentas, como instrumentos dos quais retiramos bom uso, se soubermos manipulá-los. [...] A natureza fez das riquezas escravas, e não senhoras. Não se trata, pois, de as depreciar porque, em si mesmas, não são boas nem más, mas perfeitamente inocentes. Só de nós depende o uso, bom ou mau, que delas fizermos; o nosso espírito, a nossa consciência, são inteiramente livres para disporem à sua vontade dos bens que lhes foram confiados. Destruamos, pois, não os nossos bens, mas a cobiça que lhes perverte o uso. Quando nos tivermos tornado virtuosos, saberemos usá-los com virtude. Compreendamos que esses bens dos quais nos mandam desfazermo-nos são os desejos desregrados da alma. [...] Nada lucrais em largar o dinheiro que tendes, se continuardes a ser ricos em desejos desregrados. [...]

Eis de que forma concebe o Senhor o uso dos bens exteriores: temos de nos desfazer, não de um dinheiro que nos permite viver, mas das forças que nos levam a usá-lo mal, ou seja, das doenças da alma. [...] Temos de purificar a nossa alma, isto é, de a tornar pobre e nua, para nesse estado ouvirmos o chamamento do Salvador: «Vem e segue-Me». Ele é o caminho que percorre aquele que tem o coração puro. [...] Este considera que a fortuna, o ouro, a prata, as casas que possui, que tudo isso são graças de Deus, e mostra-Lhe o seu reconhecimento socorrendo os pobres com os seus próprios fundos. Ele sabe que possui esses bens, mais para os irmãos do que para si mesmo; longe de se tornar escravo das suas riquezas, é mais forte do que elas; não as encerra na sua alma. [...] E, se um dia o dinheiro lhe desaparecesse, aceitaria a ruína com a felicidade dos melhores dias. É esse o homem, afirmo eu, que Deus considera bem-aventurado e a quem chama «pobre em espírito» (Mt 5, 3), herdeiro certo do Reino dos Céus, que está fechado àqueles que não souberam desprender-se da sua opulência.

Clemente de Alexandria (150-c.215), teólogo
Homilia: «Os ricos salvar-se-ão?»

13 de agosto de 2008

Antes de tudo a concórdia e a paz

O Senhor disse: «Se dois de entre vós na terra unirem as suas vozes para pedir o que quer que seja, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus. Quando dois ou três estão reunidos em meu nome, eu estou lá no meio deles». Mostra assim que não é o grande número dos que rezam, mas a sua unanimidade, que obtém mais graças. «Se dois de entre vós na terra unirem as suas vozes»: Cristo põe em primeiro lugar a unidade das almas, põe antes de tudo a concórdia e a paz. Que haja plena concordância entre nós, eis o que Ele constante e firmemente ensinou.

S. Cipriano (c. 200-258), bispo de Cartago e mártir
Da Unidade da Igreja, 12

20 de julho de 2008

O inimigo apressa-se a semear o seu joio

Sabei, pois, irmão bem amados, que em todos os que prepararam a alma para se tornarem numa terra boa para a semente celeste, o inimigo apressa-se a semear o seu joio... Sabei também que aqueles que não procuram o Senhor com todo o seu coração não são tentados por Satanás de forma tão evidente; é mais às escondidas do que por manhas que ele tenta... afastá-los para longe de Deus.

S. Macário (? - 405), monge no Egito

6 de fevereiro de 2008

Não somos autores de nós próprios

O que é converter-se, na realidade? Converter-se significa procurar Deus, estar com Deus, seguir docilmente os ensinamentos do seu Filho, de Jesus Cristo; converter-se não é um esforço para se auto-realizar a si mesmo, porque o ser humano não é o arquitecto do próprio destino eterno. Não fomos nós que nos fizemos. Por isso a auto-realização é uma contradição e é também demasiado pouco para nós. Temos um destino mais nobre. Poderíamos dizer que a conversão consiste precisamente em não se considerar "criadores" de si mesmos e assim descobrir a verdade, porque não somos autores de nós próprios. A conversão consiste em aceitar livremente e com amor de depender em tudo de Deus, o nosso verdadeiro Criador, de depender do amor. Esta não é uma dependência mas liberdade.

10 de janeiro de 2008

O Senhor Me ungiu

“Cumpriu-se hoje esta palavra da Escritura que acabais de ouvir: ‘O Espírito do Senhor repousa sobre mim, porque o Senhor me ungiu’ (Is 61, 1).” É como se Cristo tivesse dito: Porque o Senhor Me ungiu, Eu disse sim, disse-o verdadeiramente, e volto a dizê-lo: O Espírito do Senhor repousa sobre Mim. Onde foi, pois, em que momento foi que o Senhor Me ungiu? Ungiu-Me quando fui concebido, ou melhor, ungiu-Me a fim de que fosse concebido no seio de Minha Mãe. Porque não foi da semente de um homem que uma mulher Me concebeu, antes uma Virgem Me concebeu da unção do Espírito Santo. Foi então que o Senhor Me assinalou com a unção real; consagrou-Me rei ungindo-Me, ao mesmo tempo que Me consagrava sacerdote. E pela segunda vez, no Jordão, o Senhor consagrou-Me por esse mesmo Espírito. […]

E por que está o Espírito do Senhor sobre Mim? […] “Enviou-me a levar a boa nova aos pobres, a curar os corações despedaçados” (Is 61, 1). Não Me enviou aos orgulhosos nem aos “que têm saúde”, mas como “médico aos doentes” e aos corações despedaçados. Não Me enviou “aos justos” mas “aos pecadores” (Mc 2, 17). Fez de Mim um “homem de dores, experimentado nos sofrimentos” (Is 53, 3), um homem “manso e humilde de coração” (Mt 11, 29). Enviou-Me “a anunciar a amnistia aos cativos e a liberdade aos prisioneiros” (Is 61, 1). […] A que prisioneiros, ou antes, de que prisão venho anunciar a libertação? A que cativos venho anunciar a liberdade? Desde que “por um só homem entrou o pecado no mundo e, pelo pecado, a morte” (Rom 5, 12), todos os homens são prisioneiros do pecado, todos são cativos da morte. […] Eu fui enviado “a consolar […] os amargurados de Sião” (Is 61, 2-3), todos quantos se afligem por terem sido, devido aos seus pecados, privados e separados de sua mãe, a “Jerusalém lá do alto” (Ga 4, 26). […] Sim, consolá-los-ei dando-lhes “uma coroa em vez das cinzas” da penitência, o “óleo da alegria”, ou seja, a consolação do Espírito Santo, “em vez do luto” da orfandade e do exílio, uma veste de festa, ou seja, a glória da Ressurreição “em vez do desespero” (Is 61, 3).

Rupert de Deutz (c. 1075-1130),
monge beneditino
Sobre a Santíssima Trindade, 42

9 de janeiro de 2008

Jesus junto à Igreja

Os apóstolos atravessam o lago. Jesus está sozinho em terra, enquanto eles se esgotam a remar sem poderem avançar, porque o vento é contrário. Jesus ora e, na sua oração, vê-os esforçarem-se por avançar. Vem logo ao seu encontro. É claro que este texto está cheio de símbolos da Igreja: os apóstolos sobre o mar e contra o vento, e o Senhor ao pé do Pai. Mas o que é determinante é que, na sua oração, enquanto está “ao pé do Pai”, não está ausente; bem pelo contrário, ao rezar Ele vê-os. Quando Jesus está junto do Pai, está presente na Igreja. O problema da vinda final de Cristo é aqui aprofundado e transformado de modo trinitário: Jesus vê a Igreja no Pai e, pelo poder do Pai e pela força do seu diálogo com Ele, está presente junto dela. É justamente este diálogo com o Pai enquanto “está no monte” que O torna presente, e inversamente. A Igreja é por assim dizer objecto de conversação entre o Pai e o Filho, portanto, ela própria ancorada na vida trinitária.

Cardeal Joseph Ratzinger [Papa Bento XVI]
O Deus de Jesus Cristo

8 de janeiro de 2008

Não podeis viver sem amor

[Jesus dizia a Santa Catarina:] É toda a Essência divina o que recebeis neste sacramento, sob essa brancura do pão. Tal como o sol é indivisível, assim Deus se encontra todo inteiro e o homem todo inteiro na brancura da hóstia. Ainda que dividíssemos a hóstia em milhares de migalhas, se isso fosse possível, em cada uma delas eu estou ainda, Deus inteiro, homem inteiro, tal como te disse...

Suponhamos que haja várias pessoas a virem buscar luz com círios. Uma traz um círio de cem gramas, outra de duzentos e uma terceira de trezentos gramas; uma outra traz um círio de meio quilo e outra de mais ainda. Todas se aproximam da luz e cada uma acende o seu círio. Em cada círio aceso, seja qual for o seu volume, vê-se agora a luz toda inteira, com a sua cor, o seu calor e o seu brilho... Assim acontece aos que se aproximam deste sacramento. Cada um traz o seu círio, quer dizer, o santo desejo com que recebe e toma o sacramento. O círio está apagado e acende-se quando se recebe este sacramento. Digo que está apagado porque por vós mesmos não sois nada. É verdade que vos dei a matéria com que podeis receber e conservar em vós esta luz. Essa matéria é o amor, porque vos criei por amor; é por isso que não podeis viver sem amor.

Santa Catarina de Sena (1347-1380),
terceira dominicana, doutora da Igreja, co-padroeira da Europa
O Diálogo

5 de janeiro de 2008

Deus nos procurou

Nós fomos procurados, e só podemos falar depois de termos sido encontrados; longe de nós, pois, qualquer sentimento de orgulho. Estávamos perdidos para sempre, se Deus não tivesse ido à nossa procura para nos encontrar.

Santo Agostinho (354-430),
bispo de Hipona (norte de África) e doutor da Igreja
Sermões sobre São João, nº 7

O Mistério sempre novo

O Verbo de Deus nasceu segundo a carne uma vez por todas. Mas pela sua bondade e condescendência para com os homens, quer nascer sempre espiritualmente naqueles que o desejam. Quer tornar-se criança, que vai se formando neles com o crescimento das virtudes; e manifesta-se na medida em que pode compreendê-lo quem o recebe. Se não se comunica com o esplendor de sua grandeza, não é porque não deseje, mas porque conhece as limitações das faculdades receptivas de cada um. Assim, o Verbo de Deus revela-se sempre a nós do modo que nos convém, e contudo ninguém pode conhecê-lo perfeitamente, por causa da imensidade de seu mistério.

Nasce o Cristo, Deus que se faz homem, assumindo um corpo dotado de uma alma racional, ele por quem tudo que existe saiu do nada. No Oriente brilha uma estrela visível em pleno dia e conduz os magos ao lugar onde está deitado o Verbo feito homem, para demonstrar misticamente que o Verbo, contido na lei e nos profetas, supera o conhecimento sensível e conduz as nações à plena luz do conhecimento.

Com efeito, a palavra da lei e dos profetas, entendida à luz da fé, é semelhante a uma estrela que conduz ao conhecimento do Verbo encarnado todos os que foram chamados pelo poder da graça, segundo o desígnio de Deus.

Deus se fez homem perfeito, sem que nada lhe faltasse do que é próprio da natureza humana, à exceção do pecado (o qual, aliás, não era inerente à natureza humana).

O grande mistério da encarnação de Deus permanecerá sempre um mistério! Como pode o Verbo que está em pessoa e essencialmente na carne existir ao mesmo tempo em pessoa e essencialmente junto do Pai? Como pode o Verbo, totalmente Deus por natureza, fazer-se totalmente homem por natureza, sem detrimento algum das duas naturezas, nem da divina, na qual é Deus nem da humana, na qual se fez homem?

Só a fé pode alcançar estes mistérios, ela que é precisamente a substância e o fundamento das realidades que ultrapassam toda inteligência e compreensão.

Jesus Cristo é o mesmo ontem e hoje e por toda a eternidade.

São Máximo, confessor, abade

Fonte: Oficio das leituras, Liturgia das Horas