O Senhor Me ungiu
“Cumpriu-se hoje esta palavra da Escritura que acabais de ouvir: ‘O Espírito do Senhor repousa sobre mim, porque o Senhor me ungiu’ (Is 61, 1).” É como se Cristo tivesse dito: Porque o Senhor Me ungiu, Eu disse sim, disse-o verdadeiramente, e volto a dizê-lo: O Espírito do Senhor repousa sobre Mim. Onde foi, pois, em que momento foi que o Senhor Me ungiu? Ungiu-Me quando fui concebido, ou melhor, ungiu-Me a fim de que fosse concebido no seio de Minha Mãe. Porque não foi da semente de um homem que uma mulher Me concebeu, antes uma Virgem Me concebeu da unção do Espírito Santo. Foi então que o Senhor Me assinalou com a unção real; consagrou-Me rei ungindo-Me, ao mesmo tempo que Me consagrava sacerdote. E pela segunda vez, no Jordão, o Senhor consagrou-Me por esse mesmo Espírito. […]
E por que está o Espírito do Senhor sobre Mim? […] “Enviou-me a levar a boa nova aos pobres, a curar os corações despedaçados” (Is 61, 1). Não Me enviou aos orgulhosos nem aos “que têm saúde”, mas como “médico aos doentes” e aos corações despedaçados. Não Me enviou “aos justos” mas “aos pecadores” (Mc 2, 17). Fez de Mim um “homem de dores, experimentado nos sofrimentos” (Is 53, 3), um homem “manso e humilde de coração” (Mt 11, 29). Enviou-Me “a anunciar a amnistia aos cativos e a liberdade aos prisioneiros” (Is 61, 1). […] A que prisioneiros, ou antes, de que prisão venho anunciar a libertação? A que cativos venho anunciar a liberdade? Desde que “por um só homem entrou o pecado no mundo e, pelo pecado, a morte” (Rom 5, 12), todos os homens são prisioneiros do pecado, todos são cativos da morte. […] Eu fui enviado “a consolar […] os amargurados de Sião” (Is 61, 2-3), todos quantos se afligem por terem sido, devido aos seus pecados, privados e separados de sua mãe, a “Jerusalém lá do alto” (Ga 4, 26). […] Sim, consolá-los-ei dando-lhes “uma coroa em vez das cinzas” da penitência, o “óleo da alegria”, ou seja, a consolação do Espírito Santo, “em vez do luto” da orfandade e do exílio, uma veste de festa, ou seja, a glória da Ressurreição “em vez do desespero” (Is 61, 3).
Rupert de Deutz (c. 1075-1130),
monge beneditino
Sobre a Santíssima Trindade, 42
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